segunda-feira, 29 de julho de 2013

Coerência?

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que, de um lado, aconselha vivamente o uso combinado de coleira de bicos (prong collar) e de "coleira para cães dominantes" (dominant dog collar), mas, por outro lado, afirma convictamente que uma coleira de choques eléctricos é «100 vezes mais humana e mais eficiente do que estranguladoras ou coleiras de bicos»? 

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que baseia toda o seu programa numa "estrutura de matilha" e numa afirmação do dono do cão como líder dessa estrutura, mas que, ao mesmo tempo, não consegue providenciar nenhuma forma de treino e educação que escape ao uso de utensílios mediadores? Não seria de esperar que a afirmação de um dono como líder alfa da matilha lá de casa dispensasse qualquer recurso a instrumentos de consolidação do poder? Qual o interesse em afirmar uma pretensa posição de liderança, se para isso é necessário um ininterrupto controlo da acção do cão, na maior parte das vezes se tratando de um controlo mediado por instrumentos técnicos?

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que faz das seguintes frases um lema promocional de um seu produto: «Esta coleira não deverá ser usada para infligir uma correcção dolorosa. Ela deve ser usada para retirar o ar de um cão agressivo e dominante»? Qual a distinção que se pode fazer entre "doloroso" e "retirar o ar de um cão"? A mim, de momento, escapa-me tal distinção, mas, de facto, não tenho cinquenta anos de experiência de uso de tais instrumentos...

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que, para dissuadir os donos de cães de realizarem certas práticas, faz uso recorrente do argumento "um lobo alfa nunca faria isso", mas, ao mesmo tempo, aconselha que 99% da relação com o respectivo cão, nas primeiras semanas ou meses deste lá em casa, seja feita com uma trela posta ou com o cão enfiado numa caixa-transportadora (crate)? Qual é o lobo, alfa ou omega, que passeia os seus filhotes ou inferiores membros da alcateia com uma sofisticada e vistosa trela? 

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que desaconselha, em termos absolutos, qualquer interacção entre os nossos cães e os outros cães na rua? Será possível imaginar forma mais eficaz de tornar o nosso cão num animal extremamente insociável, e, como tal, extremamente difícil de ser passeado num qualquer ambiente urbano?

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que, ao mesmo tempo, realça as virtudes de uma socialização do nosso cão com pessoas, mas desaconselha vivamente que algum estranho faça festas ao nosso cão? Que conceito será esse de socialização que apenas implica a convivência próxima com elementos já conhecidos?

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que não se cansa de alertar para formas de prevenir mordidas de cães e, ao mesmo tempo, aconselha a que o dono (e estou a citar) «se envolva fisicamente com cães de rua» que não se afastem do nosso cão, nos nossos passeios?

O que pensar de um sistema de treino e educação de cães que aconselha a sua audiência a transportar gás pimenta para usá-lo em cães de rua que se aproximem de nós e do nosso cão quando andamos na rua?


Serão precisos mais cinquenta anos de experiência para que esta gente se aperceba de tamanhas incoerências e absurdos?

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